Distantes, atomicamente, compartilhavam no entanto, do mesmo sol. Aquele que às vezes, preguiçosamente, risca o céu de abóbora e purpurina, indiferente aos destinos e as estradas sulcadas pelos bilhões que devem sua existência ao fato de que ele, o sol, não tem grandes crises.A crise, minúscula cosmicamente, é labirinto, Minotauro, tesouros e depois a perda do fio, para aqueles que a sente. É a crise de estar sob um sol e crer-se maior, banhado e justificado.
Distantes, cronologicamente, compartilhavam, sem saber, da mesma crise: de ter olhos. Ele, um antigo, moldado em estradas, em mentiras bem contadas, em danças frenéticas. Ela, dois: um cruel, feito de objetos agudos e afiados, aço de deuses esquecidos; outro, caleidoscópio, de flores ainda bebês, de cores ainda desconhecidas. A crise dos olhos valia pelo tempo que o sol insistia em iluminar o mundo: sentados, onde quer que fosse, via como os risos eram-lhe distantes, como as mãos enlaçadas eram-lhes estrangeiras, como a vida contida em crianças eram-lhe punitivas.
Sentados sob o sol, era-lhes um espaço mais adequado os dos trilhos de trem: sempre havia um outro trilho depois de outro e de outro. Não o percorriam. Sentiam apenas que havia trilhos e trilhos, debandados e espalhados, alcançando lugares que nunca iriam. Mesmo os pés já não eram mais do que obrigações, percorriam as mesmas alamedas, cumprimentavam da mesma forma os mesmos rostos. Era mais adequado pois o saber-se nunca ir era saber-se sempre estar. Isso ainda bastava.
Bastava, mesmo quando o sol, tocando a harpa panegírica do Tempo, insistiam em descobrir das sombras tanta energia em buscar fugir da crise. Pois era isso: ri-se, corre-se, ama-se, fugindo da crise. Busca-se os trilhos crendo que a velocidade é inimiga da imersão. Sentados, olhavam os bilhões que não imaginavam que, o sol, maléfico, se poria em alguns minutos, e restaria a sombra, trazendo de volta, ciclicamente, a crise que todos buscam roubar da vida. A crise, ela, senta-se sempre com eles e ceia.
Para eles, a crise passeia de mãos dadas e aponta para o horizonte, mostrando não para aonde se vai. Aponta para a saída que nunca existirá. Sentados sob o sol, distantes, sempre,a crise os acompanha e faz promessas de um tempo que nunca acontecerá.
Vocês dois tão(sic) tirando.
ResponderExcluir